sexta-feira, 29 de abril de 2022

Sempre nua

Então folheio um livro qualquer, divagando sobre o que leio.
Essa poesia, escrevo como a última de minha vida. 
Cada letra ecoa e se torna parte de uma melodia,
compondo a música perfeita de uma trilha sonora.
E com o que leio, escrevo ou ouço, tento sempre refletir amor.
Portanto, quando - e se - declaro meu amor, é honesto. Da minha alma para as suas.

Afinal, isto é o que somos. Almas.

E quero a minha sempre nua, a banhar-se de sol. Com seus braços abertos, sentada ao parapeito. Sentindo-se. Lendo-se. Escrevendo-se. Sendo-se.

Entregue ao momento da nossa humilde existência, mesmo sem saber se o verei [ao sol] no alvorecer. Ainda que certo que ali, ele estará.

Chiaroscuro

A renascer
Na pintura
Na arte
Na tela
Sobre óleo

De Caravaggio
As curvas
O ângulo
A inclinação
Do corpo
Da boca
Dos olhos

De escuridão
Uma vida
Aqui
Remanescente
Renascente
Renascentista.

Sobre os trilhos

Caminhando com a alma embriagada de felicidade, me tenho como par, nessa valsa incessante e findável. Piso no contratempo, respiro em suas pausas, faço minhas piruetas no clímax que recebo da melodia vital que ecoa em mim.
Vou me equilibrando nos trilhos. Pé ante pé. Sem a menor pista do meu destino, que ilusoriamente, eu mesmo traço. 
Afinal, o maquinista não sou eu. Mas eu escolho se aguardo na estação ou se sigo bailando sobre os trilhos, até chegar o próximo trem!

terça-feira, 26 de abril de 2022

Feito de mim

E eu me perdi. 
Por tantas e inúmeras e incontáveis vezes, eu me perdi. 
Fui deixado, menino, às margens de mim mesmo. Sem saber se podia me adentrar, aprofundar-me em mim.
Molhei meus pés sem saber se lavava as mãos. Molhei as mãos sem poder lavar o rosto. 
O rosto sujo, cujo reflexo busquei na superfície desse rio que sou. E não encontrei.

Pronto para desaguar-me ao mar. Mas não fui. Não me deixei ir. Não me deixei ser.
Parado ali, na desculpa estapafúrdia do "nada", me torturei. Nada sei, nada sinto. Tenho nada. Sou nada.

Encontrei-me refletido e eu tinha a cara limpa. Pudemos conversar.
E ensinei-me. Na dor, mas ensinei-me. Vivi minha ditadura, camuflada em felicidade constante. Turbilhonando-me sentimentos, vozes, pensamentos, ensinamentos, vaos e inválidos. Invalidados.
O nada.
E na dor de ensinar-me e de aprender-me, fui. Quando todos já eram.
Pude ser. Quando deixei-me ser.

E hoje, sendo, sento à margem de mim, e vejo meu rio cursar, curveando por onde quer ir. Molho meus pés, nas minhas águas. E os tornozelos. As pernas. Mergulho-me. Afundo-me. Adentro-me e aprofundo-me. 
Que delícia ser. Enquanto percebo que os outros ainda nem são. Ainda buscam ser.
Que delícia já não camuflar-me mais em felicidade constante, mas preencher meus nadas com ela.
Ocupar-me comigo mesmo. Em observar-me, em ensinar-me com amor, em cursar meu rio e deixar-me desaguar no mar que também sou eu. Porque e feito de mim. Águas novas e águas passadas. Eu.

E agora, posso sentar-me à minha baía e observar o sol a nascer, as nuvens a passar, os pássaros a cantar. Posso chorar ou sorrir, cantar ou dançar, observando que o amanhã sempre vem. E há sempre uma nova oportunidade de encontrar-me. Por tantas e inúmeras e incontáveis vezes, encontrar-me. Sentado, menino, às margens de mim. Apenas sendo.

Família

Onde se encontra um verdadeiro lar. É refúgio, carinho, atenção e puxão de orelha. 
É risada, é abraço, é colo, é choro.
Onde o amor brota. Onde aprendemos o que é o amor.
Onde estamos seguros, mesmo que com medo. E podemos ser exatamente quem e como somos. 
É aquilo que dói na distância. E não muda nada, não importando o tempo que passe. Família sempre será Família. 
Seu signnificado terá entradas intermináveis no dicionário. E seu sentido transcende a conexão sanguínea, mas cria pontes floridas, construídas sobre os pilares do amor.

segunda-feira, 25 de abril de 2022

Frenesi

Me balanço.
Não há mais nada ao meu redor. Nem dentro. Nem fora.
Existe eu. Existe o movimento do meu corpo. E o movimento que eu acredito que ele faz. E existe a liberdade. 
De ser, de estar, de balançar.
Livre.
Livrado.
Liberto.
Num transe incalculável, onde eu não sou mais eu.
Ou melhor, onde sou exatamente eu.
Transcendente.
E eu me balanço.
E eu me sou.
O ruído de fora, que me move os pés, é o ruído de dentro.
E vai caminhando por mim, até que eu interrompo esse frenesi, no medo de ser tão eu que me exploda, ou que voe e não saiba mais voltar.
Eu abro os olhos e ainda piso o chão.
Ainda estou inteiro.
Mas todos veem minhas asas abertas.